O Ministério Público do Estado do Ceará vem a público esclarecer os fatos referentes a um pedido de adoção que tramita na comarca de Tianguá e que tem repercutido nas redes sociais nos últimos dias.
1. No dia 13 de agosto de 2020, o Ministério Público do Estado do Ceará ingressou com ação solicitando a destituição do poder familiar de um bebê que havia sido entregue voluntariamente pela genitora, em Tianguá. A criança foi institucionalizada em acolhimento do município. A genitora, apesar de formalmente notificada, não compareceu a nenhum ato do processo;
2. Em outubro, após autorização do Judiciário para fortalecimento dos vínculos (visitas dos pretendentes ao acolhimento e, portanto, sem a saída do bebê) entre a referida criança e o primeiro casal (pretendente) habilitado na fila do Sistema Nacional de Adoção (SNA) da comarca, a coordenadora da instituição fez contatos com o casal Gabriela Fernandes Moreira e Thallys Antônio Bevilaqua de Lima, residente em Tianguá. A coordenadora do acolhimento por sua vez, autorizou a saída da criança para passar fins de semana e, inclusive, uma semana inteira na residência dos pretendentes, sem autorização judicial e sem consentimento da autoridade judiciária e do Ministério Público, ou seja, contra as hipóteses previstas em lei. Este fato só chegou ao conhecimento do MP no dia 16 de dezembro de 2020, através de vídeo publicado nas redes sociais.
3. Há de se ressaltar que a guarda apenas é concedida pelo juízo competente, após oitiva do membro do Ministério Público (artigo 33, § 1°, da Lei 8069/90). Atente-se, no entanto, que mesmo diante da autorização judicial de apenas haver o fortalecimento dos vínculos da criança com o casal, sem a saída do menor dos átrios do acolhimento institucional e na companhia de um profissional habilitado, a coordenadora do acolhimento descumpriu o procedimento previsto nos arts. 46 e 197-C, previstos no ECA.
4. Ademais, posteriormente, houve a constatação de um equívoco. O casal comunicado não estava formalmente habilitado, pois faltavam documentos que o casal, apesar de notificado, não acostou ao processo à época. O casal foi intimado para juntar todos os documentos faltantes e regularizarem o processo, o que não o fez, dando ensejo à correta extinção do processo sem resolução de mérito.
5. Comunicado do equívoco ocorrido (cadastro equivocado dos pretendentes) e posterior correção, e ante a irregularidade verificada, ao ser consultado, o Ministério Público posicionou-se pela convocação criteriosa dos habilitados no cadastro de adoção da comarca, conforme disposto no artigo 50, § 12°, da Lei 8069/90;
6. Observe-se que, mesmo com a regularização da documentação dos pretendentes à adoção e posterior reinclusão ao Cadastro Nacional de Adoção, a decisão de destituição do poder familiar do bebê foi exarada no dia 15/12/2020, de forma que a guarda apenas poderia ter sido concedida após esta data, momento em que o casal já não mais ocupava posição superior no cadastro, constando como o sexto na fila de adoção.
7. Urge ainda salientar acerca da importância do correto e legal seguimento do trâmite de adoção e, em que pese o Ministério Público se solidarizar com a dor dos pretendentes, é necessário que o Órgão Ministerial, como fiscal da lei, aja conforme os preceitos legais, tendo em vista ainda que enquanto órgão com atribuição de zelar pela obediência da ordem cronológica do cadastro de adoção e do melhor interesse da criança (trabalhar para que seja entregue apenas a pessoa formalmente habilitada, evitando inclusive futuras e costumeiras “devoluções” das crianças que geram traumas irreparáveis).
8. Outrossim, ressalte-se que sem a guarda do bebê ou autorização judicial os pretendentes ou qualquer outro não podem expor a imagem da criança, visto que de acordo com o artigo 17 do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8069/90), o direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais, ocorrência que está sendo verificada e a qual se tomarão todas providências no sentido de responsabilizar a coordenadora do acolhimento em razão da concessão da guarda sem autorização das autoridades competentes.
Ministério Público do Estado do Ceará
17 de dezembro de 2020