O Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE), por meio da Promotoria de Justiça de Jijoca de Jericoacoara, expediu recomendação na última quarta-feira (27/09) para questionar lei municipal que anistia as edificações urbanas irregulares. A recomendação foi feita ao prefeito de Jijoca, Lindbergh Martins, e ao presidente da Câmara Municipal, José Arnoldo Dias Ferreira.
Segundo o promotor de Justiça Francisco das Chagas, a Lei Complementar Municipal nº 475/2017 possibilita que os proprietários de edificações irregulares possam regularizar perante a Prefeitura os imóveis construídos até maio de 2017, por meio de procedimento administrativo e pagamento de multa compensatória, sem necessidade de adequação do imóvel às regras urbanísticas locais. O promotor ressalta que o dispositivo legal já é a reedição de uma lei de 2015, evidenciando que o Poder Público tenta contornar a problemática da desordem urbana e que, se nada for feito, essa prática pode se repetir nos anos vindouros com a reedição de leis nesse sentido, alargando o requisito temporal. Além disso, não há na Lei critérios razoáveis ou claros exigidos para que determinado imóvel seja regularizado.
O promotor de Justiça enfatiza que a ausência de controle estatal nas edificações, ou a dispensa ou redução de limitações administrativas, na forma como posta na Lei Complementar, empodera os interesses particulares, que, como já vem ocorrendo, ditam as formas de uso e ocupação do solo em contrariedade às leis urbanísticas municipais. “O referido dispositivo legal é de extrema prejudicialidade ao ordenamento urbano local e à qualidade de vida dos cidadãos de Jijoca de Jericoacoara, levando em conta ainda os problemas trazidos pela relevância turística da cidade e pela especulação imobiliária”, afirma o promotor.
Além disso, com base nas informações colhidas em inquérito civil, a Promotoria verificou que houve descumprimento ao § 4º do artigo 40 do Estatuto da Cidade, pois o conteúdo do projeto de lei não foi substanciado em nenhum parecer técnico, tampouco o projeto foi submetido à apreciação da sociedade, por meio da promoção de audiências públicas e debates. “Não fosse o Ministério Público, talvez ninguém tivesse conhecimento da referida legislação, a não ser os beneficiados dela. Dito isto, sequer foi dada a ela a publicidade esperada, levando em consideração uma tomada de postura bastante discutível”, afirma o promotor. A Lei Complementar 475/2017 também conflita diretamente com o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano, o Código de Obras e Posturas, a Lei Orgânica Municipal, o Estatuto da Cidade, a Constituição do Estado do Ceará e a Constituição Federal.
Dessa forma, o MPCE requer ao prefeito de Jijoca que: envie projeto de lei à Câmara para revogar a Lei Complementar Municipal nº 475/2017, declare nulo todos os procedimentos em tramitação e concluídos de regularização de edificações irregulares, se abstenha de remeter novo projeto de lei ou reedição da referida lei com tema correlato e de receber pedidos de regularização, entre outros. O MPCE requisita ainda a relação dos prédios regularizados com base na referida Lei.
A Promotoria de Justiça também requer ao presidente da Câmara que coloque em pauta em próxima sessão debate acerca da revogação da Lei Complementar Municipal nº 475/2017 e que os vereadores se abstenham de votar projetos de lei ou reeditar a referida lei com tema correlato.
O prazo dado à Prefeitura e à Câmara é de 15 dias. O não acatamento infundado ou a insuficiência dos fundamentos apresentados para não acatar total ou parcialmente a recomendação ensejará a propositura de ação civil pública e poderá ocasionar a responsabilização pelos danos patrimoniais e morais causados coletivamente.