O Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE), por intermédio da 111ª Promotoria de Justiça da Comarca de Fortaleza, ofereceu, na manhã desta quinta-feira (23), uma denúncia contra Eberson de Oliveira Matos, vulgo “Tio Paulista”, atualmente recolhido no sistema prisional, acusado de ter assassinado a vítima, F.F.A., a golpes de canivete, durante uma discussão banal. O processo está em tramitação perante a 5ª Vara do Tribunal do Júri.
Na peça, o Ministério Público requer que, com urgência, o denunciado seja citado para apresentar sua resposta à acusação, dando-se prosseguimento ao feito, com a posterior pronúncia e submissão do caso ao Tribunal do Júri, a fim de que, ao final, seja ele condenado pelo crime de homicídio qualificado, na forma do artigo 121, § 2º, incisos II e IV do Código Penal Brasileiro (CPB).
Em caso de condenação, o MPCE pede, ainda, que a Justiça fixe um valor para reparação dos danos causados pelo denunciado à família da vítima, que se viu violentamente privada de seu convívio pela conduta criminosa, com amparo no artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal (CPP), no valor de R$ 40.500,00.
O referido valor foi tomado como parâmetro o triplo da indenização por morte paga pelo DPVAT em casos de mortes no trânsito. O homicídio é de natureza dolosa, ainda que na sua modalidade eventual, merecendo uma maior reprovação em relação a uma morte involuntária.
O Ministério Público requer, desde já, que quando da realização de audiência de instrução, conste expressamente do mandado de intimação que o Oficial de Justiça, à luz do artigo 217 do CPP, verifique se as testemunhas possuíam algum temor ou constrangimento em prestar o depoimento na presença do réu, caso em que está autorizada sua oitiva por videoconferência.
Segundo constam dos autos, no dia 04 de março de 2023, por volta das 16h30, o acusado Eberson de Oliveira Matos, utilizando-se de instrumento perfurocortante (canivete), assumindo o risco de morte, efetuou golpes contra a vítima, F.F.A., no Posto Penha, na avenida Osório de Paiva, nº 1899, nesta capital. A violência provocou-lhe as lesões descritas em Laudo Pericial Cadavérico, que foram causa suficiente para a sua morte devido a choque hipovolêmico por lesão de artéria e veia axilares esquerdas.
Conforme apurado, Eberson (vulgo “Tio Paulista”) estava ingerindo bebidas na loja de conveniência do referido posto de combustível, quando iniciou-se uma discussão banal entre o acusado e a vítima. A mulher teria solicitado que o réu observasse que estava falando alto ao usar o telefone celular, gerando incômodo ao ambiente. Por sua vez, Eberson respondeu à solicitação com violência moral, agredindo a vítima verbalmente.
Logo em seguida, o acusado foi retirado da loja de conveniência, mas permaneceu na parte exterior do posto de combustíveis, pois desejava se confrontar com a vítima quando de sua saída. Vale notar que o acusado estava de posse de um canivete, contudo não o mostrou para ninguém, pois pretendia surpreender a vítima no confronto.
Abalada pelas ofensas recebidas, em determinado momento a vítima foi tomar satisfação com o representado, desferindo-lhe um tapa. Valendo-se do uso imoderado da reação e tão pouco atendo-se à evidente desproporcionalidade de uma suposta legítima defesa, de posse de um canivete, sem nada anunciar, o acusado surpreendeu a vítima com um golpe, provocando-lhe lesões ”em forma de Y na projeção do ombro e região infraclavicular esquerda”.
No entendimento do MPCE, o acusado assumiu o risco de matar a vítima. O acusado nada fez para remediar seu ato irresponsável, de modo que não demonstrou qualquer arrependimento naquele momento. O ferimento atingiu artéria e veia axilares esquerdas. Não se trata apenas de falta de sorte da vítima ou mera imprudência do acusado: o réu atingiu a vítima em local nobre do corpo, portanto, teria que antever a possibilidade de causar a sua morte.
A vítima foi socorrida e levada ao Hospital Instituto Doutor José Frota (IJF), mas infelizmente não resistiu à gravidade das lesões e faleceu dois dias depois, em 06 de março de 2023, em consequência dos ferimentos provocados pelo acusado. Conforme a denúncia, não era exigível que o acusado conhecesse, com profundidade o corpo humano, contudo, também não é razoável concluir que um golpe de canivete, que atinge região entre o coração e ombro, não fosse potencialmente fatal, como de fato se provou letal. Portanto, o acusado teria que assumir o risco de matar qualquer ser humano nessas condições.
A ação foi flagrada por câmeras de segurança do posto. A vítima não sabia que o acusado portava um canivete, eis que somente acionado por ocasião de sua utilização. Portanto, o acusado, já ciente que sua reação desproporcional e criminosa de ofender a vítima iria provocar uma reação, aguardou a vítima em um local mais aberto, onde, de modo furtivo, surpreendeu a vítima e a apunhalou com o canivete somente acionado nesse momento. Desse modo, o acusado utilizou de recurso que dificultou a defesa da vítima.
Após a ação criminosa, o réu evadiu-se do local e se desfez da arma do crime. Assim agindo, o denunciado cometeu o crime de homicídio por motivo fútil, consistente na reação desproporcional ao fato da vítima ter reclamado do volume da voz do réu ao falar no telefone. O acusado ainda cometeu o crime de modo a dificultar a defesa da vítima, eis que surpreendida pelo inesperado golpe de canivete.
Tal expediente, naquelas circunstâncias assemelha-se à emboscada, dado que o acusado sabia que haveria reação da vítima à injusta agressão recebida, acionando o canivete apenas em local mais aberto e “mais favorável ao injusto e covarde ataque”. Desde modo, não há dúvidas de que a vítima foi tomada de surpresa no momento da agressão fatal.